Fabiano Santos*
O foco natural de analistas e da cobertura do dia a dia da política recai sobre as eleições presidenciais. Todavia, a sociedade brasileira encontra-se mais do que alerta para a importância das eleições legislativas tendo em vista as perspectivas do que será possível fazer ou desfazer pelo próximo ou próxima mandatária do cargo presidencial. Mas o que já era óbvio para os profissionais e interessados na vida política em geral, após o tortuoso e controverso impeachment de Dilma Rousseff em abril de 2016, torna-se verdade absoluta para o conjunto dos eleitores. Portanto, de pouco vale esperar por mudanças significativas no país como resultado das eleições, se não tivermos alterações importantes na composição da Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
O tom dos analistas mais voltados para o que se passa em Brasília tem sido de pessimismo a esse respeito. Não se prevê em nenhuma análise mais cuidadosa renovação expressiva dos e das integrantes do Congresso Nacional. Como exemplo, cita-se que em torno de 80% das e dos atuais detentoras e detentores de mandato na Câmara tentam a reeleição. E, dado que os partidos tendem a beneficiar quem já possui mandato em suas decisões de distribuição de recursos de campanha, então, o cenário mais provável é o de permanência do quadro atual.
Duas questões precisam ser discutidas com mais cuidado: a) Por que seria um problema a manutenção do atual quadro? B) Seria tão improvável alguma mudança na orientação política central do Congresso?
Sim, é muito problemática a manutenção do atual cenário de representação. Em primeiro lugar, a Câmara dos Deputados tem sido muito pouco representativa dos anseios da sociedade por dois motivos principais: sua configuração religiosa, de gênero, de cor e de classe longe está de minimamente representar a diversidade social brasileira, em segundo lugar, as políticas defendidas e apoiadas pela maioria da Câmara longe estão de caminhar no sentido desejado pela maioria da população. Trataremos desta questão em intervenções vindouras.
Quanto à segunda questão, se é verdade, por um lado, que mudanças drásticas na composição do Legislativo são improváveis, por outro, nem sempre inflexões importantes nos rumos do processo legislativo dependem de alterações em sua composição. Por vezes, movimentos marginais à esquerda ou à direita na dança das cadeiras de uma eleição para outra promovem grandes efeitos políticos – basta lembrar-se do que ocorreu de 2014 para 2015 para nos certificarmos disso. Os dois gráficos abaixo fornecem boa ilustração do argumento esboçado aqui.
O primeiro gráfico mostra quanto dos/das deputados/das federais eleitos/as em 2002 permaneceram em após o pleito de 2006, o mesmo valendo para as díades 2006/2010 e 2010/2014. O segundo mostra a evolução de recandidaturas, ou seja, quanto, nos mesmos três pleitos, dos e das mandatários/as em uma legislatura tentaram a reeleição nos pleitos seguintes. Pelos números, sabe-se que algo em torno de 45% tem sido a taxa de renovação bruta da Câmara – isto é, a ascensão a uma cadeira na Casa de alguém que ali não estava na legislatura anterior é sempre relativamente alta, tendo, no entanto, ocorrido uma redução neste percentual de 2006/2010 para 2010/2014. O segundo gráfico mostra uma tendência de queda na taxa de recandidaturas, não obstante revertida para veste pleito de 2018. O ponto importante a reter é que pela leitura dos números, de maior ou menor quantidade de recandidatura ou renovação, é difícil prever a dinâmica do processo legislativo vindouro. A renovação de 2010 para 2014 foi basicamente a mesma da que vinha ocorrendo, até menor, contudo a relação do Congresso com o Executivo mudou de maneira brutal, além de termos visto a emergência de agressiva agenda conservadora sendo votada em plenário, ao arrepio das inclinações mais fundamentais da sociedade.
Do ponto de vista político, então, não se deve esperar de fato renovação significativa na composição da Câmara, mas isto não quer dizer que não haverá mudanças políticas importantes. Para tanto, basta que as poucas mudanças que vierem a ocorrer, o façam no sentido de alterar a tendência central do plenário, ou, para usar uma linguagem técnica, o posicionamento do eleitor mediano do Congresso com relação às várias políticas que vêm compondo a agenda pública do país nos últimos anos.
* Fabiano Santos é cientista político, professor do IESP/UERJ e subcoordenador do INCT - Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação
Commenti