Por Jairo Nicolau*
Um aspecto das duas últimas eleições presidenciais foi pouco salientado pelos analistas. Depois de cinco eleições (1989, 1994, 1998, 2002 e 2006) em que apenas candidatos do sexo masculino obtiveram mais de 10% dos votos, duas mulheres concorreram (Dilma Rousseff e Marina Silva), e receberam juntas cerca de 2/3 dos votos: 66% em 2010 e 63 % em 2014.
O dado é significativo, sobretudo se levarmos em conta o crônico déficit da representação das mulheres nos postos de poder no país. A pergunta óbvia é: houve diferença entre o voto de homens e mulheres nessas duas eleições?
Para tentar responder a questão, utilizei os dados do Estudo Eleitoral Brasileiro (Eseb), a principal fonte para análise do comportamento eleitoral no Brasil. A figura abaixo apresenta os resultados dos três principais candidatos nas eleições de 2010. Em que pese algumas diferenças aparentes quando os comparamos – Dilma, por exemplo, parece ter tido um desempenho melhor entre os homens –, elas são anuladas quando observamos a margem de erro (linhas verticais acima de cada barra). Portanto, em 2010 não houve diferenças expressivas entre o voto para presidente de homens e mulheres.
Os dados da disputa de 2014 são apresentados na figura abaixo. As diferenças entre o voto de homens e das mulheres novamente não são relevantes para Dilma e para o candidato do PSDB (Aécio Neves). Já para Marina Silva, observamos uma diferença fora da margem de erro; a candidata do PSB obteve proporcionalmente mais votos entre as mulheres.
Um dado que chamou a atenção de muitos analistas após a divulgação da última pesquisa do Datafolha (que foi a campo entre os dias 20 e 21 de agosto) da corrida presidencial de 2018 é o volume de mulheres indecisas e dispostas a anular ou deixar o voto em branco; no cenário em que o ex-presidente Lula não disputa a eleição o somatório chega a 34%.
A figura abaixo mostra a diferença do voto para presidente, segundo o sexo do entrevistado na pesquisa do Datafolha. Infelizmente, como não tenho acesso ao banco de dados não posso calcular a margem de erro para apresentar no gráfico.
A indecisão e a disposição de não votar em um dos concorrentes entre as mulheres é um dos dados que chama a atenção de quem olha a figura. Em outras eleições observamos padrões semelhantes para o mês de agosto. Porém, a medida que a campanha avança a tendência é que a taxa de indecisos entre os homens e as mulheres seja semelhante.
Um outro dado que salta aos olhos na figura acima é o desempenho de Jair Bolsonaro. A discrepância entre homens e mulheres é enorme. Bolsonaro têm 30% entre os homens, e apenas 14% entre as mulheres. Do outro lado, Marina repete o padrão das eleições de 2014 e tem um desempenho um pouco melhor entre as mulheres (19%), do que entre os homens (13%).
A situação atual de Bolsonaro é singular. Na história das eleições presidenciais brasileiras não há casos de um candidato à presidência com uma discrepância tão grande quando comparamos os votos de homens e mulheres.
Teoricamente, nada impede que as mulheres que ainda não têm candidato decidam-se em grande proporção por Bolsonaro. Mas acredito que a probabilidade disso acontecer seja muito baixa. Ao longo de sua carreira, Bolsonaro priorizou temas associados tradicionalmente ao mundo masculino (vida militar; porte de armas; elogio à ação violenta em política de segurança). Durante a campanha eleitoral desse ano suas propostas e comportamento aumentaram sua rejeição junto ao eleitorado feminino.
Na eventualidade de Bolsonaro passar para o segundo turno, as mulheres devem se constituir em uma barreira quase intransponível para a sua vitória. Não sabemos quem estaria com ele na disputa desse hipotético segundo turno. Provavelmente, o (a) candidato (a) que conseguir consolidar seu apoio entre o eleitorado feminino.
* Jairo Nicolau é cientista político e professor-titular na UFRJ.
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