Érica Anita Baptista*
Pedro Henrique Bicalho Camelo **
Nos dias 9 e 17 de agosto, foram realizados os dois primeiros debates televisivos entre os aspirantes à Presidência da República. Foram convidados aos encontros[i]: Álvaro Dias (Podemos), Cabo Daciolo (Patriota), Geraldo Alckmin (PSDB), Marina Silva (Rede), Jair Bolsonaro (PSL), Guilherme Boulos (PSOL), Henrique Meirelles (MDB) e Ciro Gomes (PDT). O candidato Lula da Silva (PT) não compareceu, preso em Curitiba por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Os debates, assim como outros eventos de campanha, podem não ter a audiência massiva, mas circulam em outras mídias. São importantes como fonte de informação aos eleitores e também à mídia; o encontro face a face entre os candidatos permite que os eleitores façam comparações e compreendam melhor o posicionamento dos candidatos sobre determinados temas (BENOIT, SHEAFER, 2006; JAMIESON, BIRDSELL, 1988; VASCONCELLOS, 2014). O gráfico 1 (abaixo) mostra a intenção de voto dos eleitores antes da realização do primeiro encontro:
Gráfico 1 - Intenção de voto – 6 a 8 de agosto de 2018 (%)
Os dois encontros foram tema de grande rebuliço nas redes sociais, aparecendo entre os Trending Topics do Twitter e pautando a produção de memes pelos usuários da rede. Dentre os candidatos, os representantes do Patriota e PSL, Cabo Daciolo e Jair Bolsonaro, respectivamente, foram protagonistas nas discussões dos internautas nos dias seguintes. Muito se falou também sobre Marina Silva, da Rede Sustentabilidade, após uma interpelação da ambientalista ao candidato do Partido Social Liberal.
Observamos, ainda, que desde a pré-campanha, como reflexo da atual conjuntura política brasileira, muitos candidatos procuram atacar a corrupção e apoiar a atuação da Justiça nos desdobramentos do caso da Lava Jato. Nesse caminho, vemos um reforço na polarização entre esquerda e direita, tanto pelos candidatos como pelos eleitores (acirrando as discussões, sobretudo, nas mídias sociais). E a emergência da pauta dos valores, com posições claras e demarcadas acerca de temas mais sensíveis como a legalização do aborto, a descriminalização do uso de drogas e a questão do desarmamento. No plano econômico, as falas e propostas esbarram na intervenção estatal na condução da economia, nas altas taxas de desemprego, na reforma da previdência e na cobrança de impostos federais.
O primeiro debate proposto na agenda dos presidenciáveis ocorreu na TV Bandeirantes, em 9 de agosto, ainda fora do período oficial de campanha. Sua repercussão rendeu mais memes e deboches nas redes sociais online do que análises tecidas pelos veículos da grande mídia. Ausente nas primeiras pesquisas eleitorais, Cabo Daciolo (Patriota) surpreendeu e inflamou as redes sociais.
A reação dos internautas deveu-se a uma pergunta feita pelo patriota a Ciro Gomes, representante do PDT. Cabo Daciolo interpelou o pedetista, pedindo que explicasse à “nação brasileira” sobre o “Plano Ursal”, do qual supostamente faria parte. A questão, em suas palavras, se referia a “um plano que se chama nova ordem mundial, união de toda América do Sul, conexão, tirando todas as fronteiras, fazendo uma única nação. Poucos ouviram falar isso e vai ser pouco divulgado isso” . Ciro Gomes, com uma reação surpresa, se esquivou dizendo não saber do que se tratava. A #Ursal chegou aos trending topics do Twitter brasileiro, com mais de 29 mil menções. Além disso, vale destaque aos vários memes que circularam sobre a Ursal.
Imagem 1 - URSAL vira meme
Se observarmos o gráfico 1, Cabo Daciolo (Patriota), a esta altura, não aparecia nas intenções de voto e era desconhecido a grande parte do público eleitoral; já no gráfico 2, o candidato apresenta 1% das intenções de voto em todos os cenários. Embora não possamos atribuir essa entrada nas pesquisas apenas ao desempenho de Daciolo nos debates, é possível considerar sua influência como fonte de informação e formação de opinião (BENOIT, SHEAFER, 2006; JAMIESON, BIRDSELL, 1988).
Os gráficos 1 e 2 também mostram um elefante branco das eleições de 2018. A condenação do ex-presidente Lula, figura destacada em todas as pesquisas eleitorais, tem impedido que o candidato faça campanha da forma como tradicionalmente estamos acostumados e inviabilizando a participação nos debates durante a corrida eleitoral. A sua campanha é “terceirizada” pelo Partido dos Trabalhadores (PT), pela militância e por seus apoiadores. Mas sua grande popularidade torna necessário que a as pesquisas eleitorais simulem diferentes cenários[2]: 1) com Lula (PT) candidato; 2) sem Lula e com Fernando Haddad (PT); e 3) sem Lula e com Haddad apoiado por Lula.
O gráfico 2 mostra a intenção de votos após a realização do debate na TV Bandeirantes:
Gráfico 2 – Intenção de voto – 13 a 15 de agosto de 2018 (%)
O segundo encontro dos presidenciáveis, realizado pela RedeTV em parceria com a revista Isto É, ocorreu em 17 de agosto. Em um debate morno, Marina Silva (Rede) e Jair Bolsonaro (PSL) garantiram a repercussão, ao menos, de um momento. Bolsonaro questionou Marina em relação à liberação do porte de armas. Marina se posicionou contrária a essa proposta e utilizou os minutos finais para levantar um ponto, já discutido no mesmo dia, em relação ao posicionamento de Bolsonaro sobre o salário para as mulheres – ele havia dito ser contrário à intervenção do Estado nessa questão, que devia ser um acordo “amigável” entre patrões e empregadas. Marina dispara: “Só uma pessoa que não sabe o que significa uma mulher ganhar um salário menor do que o homem e ter as mesmas capacidades, a mesma competência e ser a primeira a ser demitida, ser a última a ser promovida e quando vai à uma fila de emprego, pelo simples fato de ser mulher, não é aceita”.
O conservador se irritou e retrucou Marina acionando sua postura religiosa frente ao seu posicionamento em relação à legalização do aborto e a descriminalização das drogas, “Temos aqui uma evangélica que quer fazer um plebiscito para o aborto e para a maconha. Você não sabe o que é uma mulher, Marina, com um filho jogado no mundo das drogas”. A candidata da Rede, em sua tréplica, lembrou aos telespectadores as cenas protagonizadas por Bolsonaro instigando crianças a utilizarem armas de fogo: “Você sabe o que a bíblia diz sobre ensinar uma criança? Ensina a criança no caminho que deve andar e, até quando for grande, não se desviará do caminho”. O trecho viralizou nas mídias sociais e beneficiou a imagem de Marina Silva. Bolsonaro também rendeu memes nesse debate, quando consultou sua “colinha” de temas a serem discutidos.
Imagem 2 - "Colinha" na mão de Bolsonaro
O gráfico 3 ilustra a intenção de voto após o segundo debate televisivo. Bolsonaro se mantém quase que na margem de erro, mas a repercussão de sua participação no debate, ainda que negativa para alguns grupos e se tornando peças de deboche, não deixa de ser vantajosa para sua imagem.
Gráfico 3 – Intenção de voto – 20 a 22 de agosto de 2018 (%)
Vale mencionar que, a despeito da ausência de Lula nos debates e de sua campanha ser indireta, as pesquisas apresentadas acima evidenciam que a presença de Lula como candidato reduz consideravelmente a porcentagem de incerteza dos eleitores.
Os dois debates realizados até o momento credenciaram alguns candidatos pouco conhecidos do eleitorado, e as discussões vão definindo posturas e posicionamentos, dando a tônica da campanha eleitoral de 2018 que parece se desenhar mais em um campo conservador.
[i] Os candidatos que constam nos gráficos são apenas aqueles que participam dos debates e o indicado do PT nas simulações de cenários. Assim, a soma das porcentagens não será exata. Para dados completos, consultar a série histórica: https://www.infomoney.com.br/mercados/politica/noticia/7513479/resultados-das-pesquisas-eleitorais-para-presidente-xpipespe
[2] A legislação eleitoral prevê que os candidatos de partidos que possuam aos menos cinco parlamentares (senadores e deputados) devem ser convidados aos debates. Porém, as emissoras podem convidar candidatos que não cumprem essa exigência.
Referências
BENOIT, W.L.; SHEAFER, T. Functional Theory and Political Discourse: Televised Debates in Israel and the United States. Journalism & Mass Communication Quarterly v. 83, n.2, p. 281-297, 2006.
JAMIESON, K. H.; BIRDSELL, D. S. Presidential Debates: The Challenge of Creating an Informed Electorate: The Challenge of Creating an Informed Electorate. New York: Oxford University Press, 1988.
VASCONCELLOS, F. S. Debates presidenciais na TV como dispositivos complementares de informação política no Brasil: Características e estratégias. IX Encontro da ABCP, Brasília, 2014.
* Doutora em Ciência Política (UFMG) e pós-doutoranda no Grupo de Pesquisa em Mídia e Esfera Pública (EME-UFMG).
** Graduando em Comunicação Social (UFMG) e bolsista de iniciação científica no Grupo de Pesquisa em Mídia e Esfera Pública (EME-UFMG).
Comentários